domingo, 23 de setembro de 2007



Após ler a notícia lembrei-me que no passado dia 18/09/07 pelas 12h 37m (ainda tenho o talão de compra a servir de marcador de página) adquiri o livro de Paulo Pereira Cristóvão. Tal aquisição deveu-se ao facto de até hoje não ter entendido como é que a PJ chegou á conclusão que houve homicídio, sem no entanto nunca ter aparecido o corpo, o que possibilitou a condenação da Leonor Cipriano e João Cipriano (mãe e tio da Joana, desaparecida em 13 de Setembro de 2004).
Apesar de não ter tido ocasião para iniciar a leitura do livro procurei ver se havia referências ao grave problema levantado na noticia.
Foi sem espanto, porque me "cheirou" a jogada de antecipação o autor, um dos acusados, escrever sobre esta mesma acusação nas pags. 169, 170 o seguinte:

-" Meses depois, numa manhã de sábado, Marques Bom telefona para Cristóvão.
- Muito bom dia, caro amigo. Já viste o Expresso?
-Não, mas diz -responde Cristóvão.
-Na primeira página aparece a senhora Leonor Cipriano com os olhos negros e inchados e o título «Tortura». Dizem que nós lhe batemos, etc., etc…
- Deves estar a brincar, não? – diz Cristóvão.
- Estou, estou, vai lá ver…
- Estou a ir logo falamos.”
E mais á frente
(…)
“ – Mas que merda é esta? – diz Praxedes.- Mas alguém bateu naquela gaja?”
- Pois, para todos os efeitos ficamos conhecidos como bandidos, rapazes - responde Leonel sorrindo.
- Mas pensem lá um bocadinho, caraças - intervém Cristóvão -, vocês repararam que os olhos não têm marcas de agressões, marcas abrasivas, de objectos, etc. ? O que ali estamos a ver é o sangue pisado da cabeça dela, quando embateu contra a parede nas escadas e que, por não a terem deixado deitada, começou a descer…- continua exemplificando com a mão sobre a cabeça e a descer. - No primeiro dia está aqui - apontando para o couro cabeludo -, no segundo dia está aqui - aponta para a testa -, no terceiro dia está aqui -aponta para os olhos -, depois vai descendo, caraças… agora tiraram as fotos propositadamente quando o aspecto é pior… "
Mais á frente o autor que agora é acusado do crime escreve:
“As semanas passam até que Cristóvão recebe uma convocatória para ir prestar declarações no Departamento Técnico – Disciplinar da Polícia. Falou com os outros e todos haviam recebido a mesma convocatória. Iam falar todos na qualidade de testemunha. Como polícias experientes que eram, sabiam que esta era a prática habitual naquele departamento. (…) Estranho, ou talvez não, atendendo a tudo o que se estava a passar, Cristóvão recebe a notícia de que aquele Departamento, após ouvir os polícias reafirmarem os factos, abrira conclusão no processo endereçando-o ao Director – Nacional com um despacho de que havia fortes indícios de que os polícias haviam cometido o crime de Tortura Agravada.
Cristóvão pensa para si que tortura é fazer parte de uma Polícia onde os incompetentes, mesquinhos e serviçais com sede de protagonismo decidem a vida alheia assim. Nesse dia começa a germinar dentro de si a ideia de abandonar a Polícia.(…)”

E descrito ainda a pags.173, 174 e 175 como decorreu o interrogatório já na qualidade de arguido.

“Os meses passaram até que Leonel, Cristóvão, Marques Bom, Praxedes e Carlos são chamados para serem interrogados agora como arguidos, perante o Procurador da República de Faro.(…)
-Senhor doutor, podia-nos explicar por que é que estando vinte e tal pessoas no Departamento de Faro numa certa noite de Outubro de 2004, somos só nós os cinco que aqui estamos para ser constituídos arguidos?
O Magistrado olhou para o grupo e disse:
- A senhora Leonor Cipriano disse que os que a levaram não lhe bateram, os que a trouxeram também não lhe bateram, os mais velhos não lhe bateram, os mais novos também não, os mais magros também não e os mais gordos também não.
- Ah, muito bem – disse Meireles.
O magistrado olhou para o Cristóvão e disse:
- Mas olhe que ela a si descreve-o muito bem.
- Acredito, senhor doutor retorquiu Cristóvão -, foram muitas horas a namorar um com o outro.
(…)
Abandonaram o local depois de terem sido identificados e constituídos na qualidade de arguidos. Ninguém do grupo entendia nada do que acontecera ali. Na realidade aquele sentimento de se estar num filme qualquer de David Lynch, com o excessivo a imperar, voltava ao pensamento de cada um. Ninguém compreendera aquela explicação. O porquê de se levar a sério a teoria de que algum deles teria torturado quem quer que fosse. O porquê de serem eles ali e não outros quaisquer. Já se estavam nas tintas. Tinham desenvolvido anticorpos, cada um à sua maneira, para lidar com esta injustiça que pairava sobre as suas cabeças. Já nem conseguiam sentir indignação. Sentiam-se como a prostituta que está deitada de perna aberta enquanto o cliente se deleita de prazer em cima dela. …"


1.º- O autor, como se vê da transcrição, deduz com rapidez e de forma lógica, como surgiram as marcas de maus tratos na face da Leonor Cipriano.

E para aqueles que criticam o facto de não ter sido efectuado qualquer exame a outras partes do corpo no Centro de Saúde, antes da vitima ser entregue no estabelecimento prisional, esclarece-se que foi... porque não tinha quaisquer outros hematomas. Era desnecessário verificar o óbvio.

2.º - O polícia experiente, acha estranho receber a notícia de que o Departamento Técnico – Disciplinar da Polícia tinha aberto conclusão e endereçado ao Director Nacional com o despacho que havia fortes indícios de que os polícias haviam cometido o crime de Tortura Agravada
Salvo o devido respeit, o autor, do livro, que se considera um polícia experiente deveria saber de antemão que a conclusão só poderia ser essa por duas razões:
- Em primeiro lugar porque é tradição em Portugal os burocratas, sejam eles policias ou não, não se comprometerem pelo que enviam sempre o expediente à consideração superior. E nas policias é aquela a formula.
- Em segundo lugar o autor, policia experiente que é, devia saber que para se provar alguma coisa prova-se em tribunal, perante o Juiz de Julgamento.

Perante investigadores responde-se a perguntas, contribui-se ou não para a descoberta da verdade material, o que servirá, dizem sempre os senhores Inspectores, de atenuante em Audiência de Discussão e Julgamento. Depois, a policia, só tem que elaborar e o relatório a ser remetido ao superior hierárquico que mui doutamente suprirá... . Mas sempre sem esquecer que existem indícios suficientes...

Quantas vezes, o experiente autor, não enviou ao Ministério Publico relatórios com o seu parecer que possibilitaram a acusação de arguidos? Centenas, Milhares? Não interessa o que interessa é que muitos foram absolvidos em julgamentos e se não fosse tal relatório não seriam acusados e consequentemente não podiam provar a sua inocência.

Já dizia a minha avozinha que Deus tem - "Com arguidos nunca fiar!".


Por isso não percebo admiração!


3.º “Cristóvão pensa para si que tortura é fazer parte de uma Polícia onde os incompetentes, mesquinhos e serviçais com sede de protagonismo decidem a vida alheia assim” , escreve o experiente policia que não sabe levar na desportiva um simples inquérito que, por um simples acaso, versa sobre tortura.
Pensando bem até pode ter razão. - Não será uma cabala montada por incompetentes, mesquinhos e serviçais com sede de protagonismo?
E quem são eles para decidir a vida alheia? Se ainda fossem da Judite vá que não vá!

4.ºAqueles inspectores, agora acusados, têm a minha solidariedade, prometo que acredito neles!

E Porquê? Porque era impossível cometerem crime tão hediondo, alias a prova está nas palavras da Leonor Cipriano que disse, a fiar nas palavras do Magistrado Ministério Público, “que os que a levaram não lhe bateram, os que a trouxeram também não lhe bateram, os mais velhos não lhe bateram, os mais novos também não, os mais magros também não e os mais gordos também não.” Vê-se mesmo que está a mentir.
Isto fez-me recordar uma história passada comigo, numa inquirição que eu acompanhei na PJ. Já no final da inquirição o inspector pergunta ao arguido- "Olhe lá acha que sou o Pai Natal?".

Por isso foi constituído arguido e proibido de tomar café

Por aquela resposta, dada ao Ministério Público, vê-se mesmo que a Leonor Cipriano está a mentir.

Para quê o Inquérito se a arguida só tem uns hematomas e disse “que os que a levaram não lhe bateram, os que a trouxeram também não lhe bateram, os mais velhos não lhe bateram, os mais novos também não, os mais magros também não e os mais gordos também não.”

De mais a mais aqueles senhores são da judiciária e alguns andam à procura da Madeleine.